O “tribunal da internet” e os efeitos da cultura do cancelamento

Alguém não pode ser resumido apenas por 5 minutos ou uma atitude. É necessário conhecer mais, saber mais, viver mais dessa pessoa para ter um real entendimento.

 

A cultura do cancelamento tem chamado a atenção, principalmente nas redes sociais, por tratar-se de uma onda que incentiva pessoas a deixarem de apoiar determinadas personalidades ou empresas, públicas ou não, do meio artístico ou não, em razão de erro, conduta, ou opinião reprovável.

 

Nos termos da definição da palavra “cancelar”, a ideia do movimento é literalmente “eliminar” e “tornar sem efeito” o agente da conduta tida pelo “tribunal da internet” como reprovável.

 

Ocorre que, especificamente com relação à cultura do cancelamento, e ao contrário do Direito em que há um devido processo legal para justificar uma punição ou não, o “tribunal da internet” não costuma oportunizar sequer o exercício do contraditório.

 

Na maioria das vezes, a cultura do cancelamento costuma ter efeitos imediatos com uma onda de boicote. Tal imediatismo, porém, traz à tona certa intolerância e falta de empatia, deixando o acusado sem defesa.

 

Dessa forma, o ambiente virtual torna-se hostil, seletivo e, por vezes, injusto.

 

A partir do apontamento do suposto erro ou conduta reprovável, cria-se um movimento na rede social de exposição para que, não somente os usuários deixem de “seguir” a pessoa ou de comprar determinada marca, por exemplo, mas também para que parem de dar visibilidade ao trabalho de alguém ou determinada empresa.

 

Por meio da onda de ataques aos perfis em redes sociais, os efeitos são sentidos em todos os aspectos: na vida pessoal de pessoas físicas que perdem trabalhos, contratos, patrocínios e até desenvolvem problemas psicoemocionais, bem como na atividade de empresas que deixam de realizar vendas e atender clientes.

 

Um dos exemplos recentes da cultura do cancelamento nas redes sociais foi ocorrido com uma digital influencer do mundo fitness (Pugliese) que, durante a pandemia e o isolamento social, meses após ser diagnosticada e “se curar” do coronavírus, reuniu alguns amigos em sua casa, fazendo publicações da “festinha”.

 

A anfitriã foi imediatamente cancelada nas redes sociais, com a consequente perda de diversas parcerias e a rescisão de contratos. E apesar do pedido de desculpas e reconhecimento do erro, o cancelamento se manteve, beirando o linchamento virtual e fazendo com que ela desativasse seu perfil em uma de suas redes sociais.

 

Nesse contexto, observa-se que o “tribunal da internet” não realiza seus julgamentos com igualdade ou proporcionalidade.

  • Primeiro, porque deixa-se de discutir ideias e passa-se a discutir pessoas ou empresas.
  • Segundo, porque poucos preferem ouvir, entender e formar uma opinião antes de atacar.
  • Terceiro, porque outras pessoas ou empresas envolvidas em situações parecidas, por exemplo, não sofrem a mesma intensidade de críticas que as “canceladas”.
  • Quarto, porque no mundo virtual, é muito tênue a linha entre a crítica construtiva e o ataque revestido de ofensas.

 

Cada dia mais vivenciamos pessoas sendo cancelado virtualmente, por pensar diferente ou agir diferente!

 

As mesmas pessoas que pregam “empatia”, “sororidade”, “ser diferente é legal”, entre outras frases típicas, para não dizer clichês, são essas mesmas que, quando se deparam com alguém de opinião divergente a delas, as cancelam em massa. E muita gente tem adoecido mentalmente por conta de pessoas que pregam atitudes e não usam no dia a dia, o verdadeiro “Faça o que eu digo, não faça o que eu faço”. Já parou para pensar que uma opinião que diverge da sua é: “apenas uma opinião”?

 

Cancelar alguém por uma única atitude anula todas as outras atitudes boas e que você provavelmente concordaria e assinaria embaixo.

 

Alguém não pode ser resumido apenas por 5 minutos ou uma atitude. É necessário conhecer mais, saber mais, viver mais dessa pessoa para ter um real entendimento.

 

Não conhecemos nem 5% da vida de ninguém, pré-julgar é mais fácil quando se trata do outro, mas quando nos colocamos nessa situação, passamos a entender o quão difícil é ouvir “fatos” presumidos por pessoas que nunca te conheceram de verdade.

 

Estamos vivendo tempos tão difíceis, onde pessoas conquistam grupos específicos por implantar ideias super legais, mas que não são aplicadas no dia a dia.

 

O cancelamento vai além de falar ou difamar pessoas. Ele entra no trabalho, destrói famílias e no geral a vida de alguém.

 

Não adianta apoiar o “Setembro Amarelo” nas redes sociais e enviar pessoas para o psiquiatra e fazê-las usar antidepressivos com suas palavras intoxicadas de maldade, revestidas de uma fina capa de “críticas construtivas”.

 

O que você tem construído de bom para criticar quem ainda está no chão?

 

Josie Valério

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